E SE FÔSSEMOS TODOS SERIAL KILLERS?



Você já quis entrar na mente de um assassino em série? Descobrir como eles pensam, suas motivações para executar um crime ou descobrir mais sobre o seu passado?

Mindhunter surgiu como uma das maiores estréias da Netflix no segundo semestre de 2017 e nos apresentou a alguém que conseguiu esse feito: Holden Ford, vivido Jonathan Groff, é um profissional do FBI corajoso – e um tanto petulante – que junto de seu parceiro, Bill Tench (Holt McCallany), solucionam casos dificílimos e ficam cara a cara com alguns dos criminosos mais famosos da história.


Baseado no livro homólogo, publicado originalmente em 1996, Mindhunter foi escrito pelo próprio caçador de mentes, John Douglas – que inspirou o personagem de Groff – e pelo escritor Mark Olshaker. Os autores narram a trajetória de Douglas no FBI, sua vida pessoal, os momentos mais marcantes de sua carreira e as famosas entrevistas com os serial killers, que são o principal foco da série.


Apesar da fidelidade com a qual a série retrata os fatos, ler a narrativa das mesmas cenas já assistidas torna-se uma experiência muito mais chocante. É uma leitura forte e brutal, exige muito esforço e em alguns momentos, sangue frio - especialmente para imaginar algumas imagens que definitivamente não são muito agradáveis, mas que são extremamente reais.



Mesmo sendo pesada, a leitura é envolvente. Ver como os casos são desenvolvidos se torna viciante e logo se é absorvido para dentro do universo: ora como o policial, ora como o criminoso. Torcemos pelo plot twist, nos compadecemos de alguns personagens, tomamos as dores dos familiares. Em outros momentos, é possível se imaginar na pele do assassino, idealizando uma cena perfeita de crime, quase visualizando a vítima e os acontecimentos seguintes. Cria-se uma afeição por eles, nos influenciando a procurar informações além do livro. “Quantos ele matou?” “Ele usou outros métodos?” E é nesse ponto em que a humanidade tende a ser questionada.



Tanto no seriado quanto no livro, é possível perceber como lidar com casos tão cruéis pode interferir nas relações pessoais de um policial. Aficionado pelo trabalho e tão acostumado a se forçar a pensar como os assassinos, o depoimento de Douglas não se resume ao seu brilhantismo na condução de investigações, mas também traz sua dolorosa realidade pessoal. Além da frieza e da distância, o investigador se questiona se estaria ele próprio adquirindo as características dos homens que ele por tanto tempo esteve analisando, entrando em uma série de conflitos consigo mesmo e com pessoas próximas.


Desde que se tornou um produto a ser comercializado pelas grandes mídias, a violência deixou de ser algo que assombrava o cotidiano policial para tornar-se objeto de entretenimento de uma grande parte da população. É inegável que consumimos violência, mesmo que sem querer, por meio dos telejornais, dos filmes, dos livros. Os detalhes dos crimes reais são desejados por uma massa que os acompanha como uma novela, debatendo desfechos e pensando em um “final feliz”; e de tal forma, gerando procura e, consequentemente, uma produção cada vez maior. A violência desperta sentimentos profundos, e muitas vezes perturbadores, mas que não impedem essa busca por detalhes: medo, angústia, ódio, ansiedade. Tal como Douglas/Ford, algumas vezes somos tão sugados para esse universo violento que nos cerca que somos questionados a buscar nossa verdadeira essência no mais profundo de nossos seres. Algumas vezes, é necessário receber um abraço de um serial killer para perceber que você (não) é um deles.


Afinal, seria consumir, e não praticar a violência o que nos torna diferente dos serial killers? Ou no fundo seríamos todos tão crueis quanto eles mesmos?


(BÔNUS) Com a leitura do livro finalizada, o que podemos esperar da segunda temporada de Mindhunter? Primeiramente, mais Ed Kemper. Kemper é um personagem indispensável e auxiliou imensamente Douglas durante sua trajetória, e eles criaram até mesmo um tipo de “amizade”. A entrevista com Charles Manson, uma das primeiras feitas pelo investigador, também é muito esperada. Outros casos famosos do início dos anos 80, como o do Matador da Trilha, muito abordados no livro são algumas das possibilidades.

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